domingo, 24 de agosto de 2008

Pensar Angra do Heroísmo

Ultimamente tenho reflectido sobre a temática do desenvolvimento da ilha e do centro urbano de Angra, pensando sobre as estratégias que poderiam ser adoptadas, penso que por influência de acontecimentos que se tem por cá promovido. Desde a conferência de Maduro Dias intitulada “Angra do Heroísmo como produto turístico”, no âmbito dos 25 anos de Angra do Heroísmo - cidade Património, passando pela discussão pública do plano para o Parque Natural da ilha Terceira e pela discussão pública do PROTA- Plano Regional de Ordenamento do Território dos Açores.
Durante a participação na acção de formação “Reabilitação Urbana” organizada pela Ordem dos Arquitectos na nossa cidade questionei-me porque não poderíamos ter implementado no concelho um programa semelhante ao REVIVA-Programa de Revitalização Económica e Social do Centro Histórico de Ponta Delgada. Até teria mais sentido existir cá um programa deste género pois Angra será quiçá a cidade açoriana com mais necessidade de reabilitar os seus edifícios e de manter o seu valor, pois este é um dos fundamentais produtos turísticos que se quer divulgar e que é inigualável no panorama açoriano.
O programa, que se poderia denominar PATRIMÓNIO VIVO, seria um sistema de apoio a privados para reabilitação de edifícios na Zona Classificada de Angra do Heroísmo e talvez da sua zona de protecção também. O programa poderia oferecer apoio jurídico, logístico, arquitectónico e económico, tanto a nível financeiro como a nível de aconselhamento. Neste último ponto poderia estar aliado à proposta da Dr.ª Andreia Cardoso de promover um estudo económico do concelho, em parceria com a Câmara de Comércio, de modo a informar quais os potenciais nichos de mercado a desenvolver em determinado local.
A existência de benefícios fiscais e isenção de taxas camarárias presentes no REVIVA também poderiam ser adoptadas neste programa.
Mas a reabilitação que se deveria pretender neste programa, seria a reconstrução genuína e com qualidade dos imóveis. Evitando o que se tem praticado desde há muito no nosso centro histórico, a demolição total dos edifícios (pois muitas vezes a fachada original cai em obra!), seguindo-se a elaboração de uma cópia fiel da fachada anterior mas em blocos de betão. Quanto à tipologia original dos imóveis também não existe o cuidado de readaptá-la com cuidado, restando assim quase nada de original dos edifícios centenários. E temos perdido assim o nosso Património, pois com este tipo de reconstrução os imóveis perdem aproximadamente 80% do seu valor arquitectónico. O nosso legado não se resume a fachadas com alçados harmoniosos e ritmados, é um todo em que se deve ter em atenção aspectos construtivos, os materiais utilizados, sistemas infra-estruturais utilizados na altura dos quais devem existir vestígios… assim caímos no risco de nos transformarmos no Portugal dos Pequeninos com estes maus exemplos de reabilitação, pois apenas restarão as fachadas copiadas.
Dou alguma relevância a este ponto, claro está devido à minha formação profissional, mas também porque penso que deveria neste programa existir um grande apoio na área de arquitectura, desde a fase de projecto, ao seu desenvolvimento, até ao culminar da obra. Esta “equipa” de técnicos por assim dizer, deveria ter grandes conhecimentos sobre a construção praticada em Angra desde o seu início, adquirido através da experiência profissional ou através de algumas acções de formação que poderiam basear-se na apresentação de projectos considerados como bons exemplos de reconstrução em Angra ou noutros centros históricos portugueses, explicação e análise de técnicas construtivas e sistemas estruturais anteriormente adoptados, sugestões de algumas formas de reabilitar, promover visitas a edifícios por reabilitar e já reabilitados, etc. Esta equipa técnica que acima referi também poderia não existir e basear-se num sistema de parcerias com projectistas da região açoriana.
Para este programa resultar, teria de estar associada à DRC- Direcção Regional da Cultura no processo ou na tal suposta “equipa técnica”, de forma a evitar-se atrasos no processo através de reuniões mensais para análise dos projectos.
Criar parcerias com outras instituições e empresas, seria ponderável no sentido de aliviar o encargo financeiro do Governo Regional, mas teria de ser vista sua viabilidade a nível jurídico.
A selecção de propostas poderia ser através de uma candidatura simples, e o número de propostas a aprovar dependendo das verbas disponíveis. A atribuição de um prémio à melhor reabilitação ao fim do programa ou ao fim de x em x anos seria um aspecto interessante a ponderar, promovendo uma saudável competição.
A meu ver os objectivos chave deste programa passariam por reabilitar com qualidade o centro histórico (combatendo também o problema das térmitas), trazer as pessoas para a cidade, rejuvenescer a cidade e a sua população, promover a coesão social e a cidadania e estimular o empreendorismo (em época de crise) transmitindo segurança no investimento através de apoio a vários níveis.
Não bastará falar do passado e do presente e dizer que se tem de fazer alguma coisa como tenho escutado nas diversas conferências. É necessário discutir e traçar um futuro para a cidade e também definir uma estratégia turística objectiva tirando partido do seu Património construído, reabilitando-o obrigatoriamente. Se noutras cidades o futuro é expandir, talvez o de Angra, para além do seu normal crescimento, é cuidar do que tem, do seu legado de que todos nos orgulhamos e que é necessário reabilitar, dinamizar e repensar.
Alguns exemplos de imóveis em mau estado em Angra do Heroísmo:

Rua Frei Diogo de Chagas, Zona Classificada de A.H.

Rua do Pisão, Zona Classificada de A.H.

Rua Diogo de Teive, Zona de Protecção de A.H.

Gaveto da Rua dos Canos Verdes com a Rua de Barcelos , Zona Classificada de A.H.

Gaveto da Rua da Oliveira com a Rua de Jesus, Zona Classificada de A.H.
Rua de São Pedro, Zona Classificada de A.H.
Rua da Sé, Zona Classificada de A.H.
Rua da Sé, Zona Classificada de A.H.
Rua do Rego, Zona Classificada de A.H.
Rua da Oliveira, Zona Classificada de A.H

4 comentários:

Anónimo disse...

Dói ver tantos prédios abandonados...

Bruno Rafael disse...

a segunda foto da Rua da Sé, a casa já vem com as cadeirinhas para o desfile das Sanjoaninas incluídas? se assim for começo a pensar em comprar eheh.

Mas a sério, mesmo numa cidade pequena como a nossa se começa a notar que as pessoas trocam o centro da cidade por habitações na periferia ou nas freguesias... é pena.

rui raposo disse...

não é pena que as pessoas troquem viver na cidade por ir viver para as freguesias. pena é que o façam para ir para loteamentos sem nenhum tipo de "urbanidade", ou seja, sem as caracteristicas de vizinhança próprias desses sítios.
o post da juliana - que aproveito para felicitar pelo interesse demosntrado pelo que a rodeia, e não apenas pela preocupação própria de um início de carreira - é muito importante e tem de ser discutido de acordo com o nível dos problemas apresentados.
Aconselho vivamente o envio do texto à recente empossada presidente da cidade. pelo pouco que conheço da senhora, tenho a certeza que terás direito a uma resposta. angra precisa, e muito, de cidadãos interessados e interessantes.

rui oliveira raposo

Paulo Pereira disse...

Bem, é sempre um prazer ler os posts da Juliana. Sobre o actual, penso que não só são identificados problemas, como houve o cuidado de procurar soluções. Estou totalmente de acordo com a criação de um programa do tipo REVIVA, ou outro, que facilite o apoio financeiro, jurídico e na área da arquitectura, de modo a incentivar a reconstrução destes edifícios. Sobre as fachadas que “caem” com demasiada frequência, penso que talvez se terá de fazer depender uma boa parte do financiamento da ausência deste “azar”.
Cumprimentos